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FEUC debate desafios que a IA coloca à Academia

“Somos muito amadores em termos de avaliação, todos nós. Avaliamos como se avaliava há 50 anos”, mencionou António Dias de Figueiredo na conferência de abertura do ano letivo da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra.

“Inteligência Artificial e Pedagogia no Ensino Superior” foi tema da conferência com que a Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC) abriu o ano letivo, no dia 12 de setembro.

António Dias de Figueiredo, professor catedrático aposentado do Departamento de Engenharia Informática da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), especialista em temas de inovação tecnológica e pedagogia, foi o orador convidado.

O amadorismo na avaliação dos alunos foi um dos temas abordados.

Dias de Figueiredo abordou os desafios que a Inteligência Artificial (IA) coloca ao Ensino Superior. Para o professor, “as pedagogias progrediram muito nos últimos tempos” e os docentes não se aperceberam porque têm estado “entretidos a ensinar”.

Lembrou que nos últimos 20 anos as ciências da educação melhoraram bastante e as neurociências também. “Infelizmente há falta de ligação entre a educação e as neurociências”, lamentou.

“Nós não aprendemos a usar tecnologias nenhumas e por isso estamos a improvisar”

Enquanto no passado havia “preocupação com os saberes”, hoje é necessário “que os alunos desenvolvam competências” e, de acordo com Dias de Figueiredo, há professores que não estão “pedagogicamente preparados para o fazer”.

O aparecimento das novas tecnologias decorreu durante o tempo em que a maioria dos docentes foram professores, “nós não aprendemos a usar tecnologias nenhumas e por isso estamos a improvisar”, disse.

À RUC no final da conferência realçou que a universidade do futuro tem de passar pela participação dos estudantes e que a avaliação dos alunos pelos pares pode ter resultados positivos e “é escalável”, para universos da ordem das centenas de alunos.

Ressalvou no entanto que  não se pode generalizar e que, “só perante casos concretos” se pode saber qual avaliação usar.

A complexidade e a incerteza do mundo de hoje também tem de ser tida em conta “na transformação das competências dos alunos que vão saindo da universidade”, lembrou Dias de Figueiredo.

No âmbito de uma das parcerias que teve com a Comissão Europeia, o ex-docente da FCTUC tentou catalogar todas as pedagogias que há. Acabou por chegar às seguintes: as pedagogias da explicação, da emancipação, de projeto, da socialização, do treino e as pedagogias exploratórias. As últimas colocam o estudante a explorar, “muito como os cientistas fazem”.

“Usamos pouco as pedagogias da emancipação, do projeto e da socialização”

As pedagogias da explicação “são as ancestrais”, já as pedagogias da emancipação “são as que esperam que o estudante esteja emancipado, seja independente e que atue de forma autónoma”. As pedagogias do projeto baseiam-se no estudo de problemas, depois há as que usam as comunidades e as redes sociais, as da repetição e as de exploração. “Usamos pouco as pedagogias da emancipação, do projeto e da socialização”, esclareceu.

O medo da fraude tem levado as universidades a investir em ferramentas que detetam o chamado plágio. No entanto, para o ex-docente da FCTUC, os desafios vão passar pelas três pedagogias apontadas anteriormente. “Quando não as usamos, não as estamos a valorizar suficientemente”, garantiu.

Na avaliação tradicional “o papel do professor é meter os conhecimentos na cabeça dos alunos e o papel da avaliação é ver se os conhecimentos estão lá todos”, aclarou Dias de Figueiredo. Segundo o ex-docente da FCTUC, para o Chat GPT e para os modelos de novas linguagens, este tipo de avaliação “é uma brincadeira”. Ao ser desvalorizado o contexto ou ao ser criado um contexto falso o Chat GPT chama-lhe  “um figo”, assegurou.

“Para tirarmos partido do Chat GPT temos de lhe dar o contexto, evitarmos que salte para conclusões”

Sobre o Chat GPT (sigla que vem do inglês “Generative Pre-Trained Transformer”), Dias de Figueiredo explicou que para ser “útil” se torna necessário “pedir que se explique, que dê mais pormenores e que dê várias respostas sobre o mesmo tema”. Para o professor, as respostas diretas do Chat GPT “interessam muito pouco”.

Referiu ainda que “o potencial fabuloso” da ferramenta “resulta do diálogo”,  e insistiu na necessidade de o utilizador ter de “ter cultura para puxar por ele”. “Cultura sobre o tema mas também cultura geral”, acrescentou. Aí sim “o resultado pode ser muito proveitoso”.

Dias de Figueiredo deixou uma recomendação aos pares.

Foram muitas as perguntas que ex-docente da FCTUC deixou para reflexão. Uma delas tem a ver com a importância de estimular os docentes “a fazer alguma investigação pedagógica” em vez de só os estimular a publicar papéis “que não sejam de pedagogia”.

Que políticas? Que estratégias? Que Lideranças? Que modelos? Que Práticas? – desafios deixados pelo orador

O contraditório foi realizado com os comentários de Paulo Peixoto, pró-reitor da UC para a área da inovação pedagógica e por Rui Lourenço, docente de Métodos Científicos de Gestão da FEUC.

Para Paulo Peixoto, a Inteligência Artificial e a mudança nas avaliações cria desafios aos professores, aos alunos e às Instituições de Ensino Superior. O vice-reitor explicou porquê.

Rui Lourenço invocou o tempo recente da pandemia em que a Universidade de Coimbra “desenvolveu novas plataformas, adquiriu muitos equipamentos e os professores produziram materiais didáticos, especialmente adaptados, para aqueles tempos de pandemia”, mesmo a nível da avaliação remota “foram feitos avanços”, mas, no entendimento do professor, “passado uma ano, não ficou praticamente nada”.

Apesar de ver “o potencial das tecnologias” e das “pedagogias de nova geração” , Rui Lourenço teme no entanto que, “no fim de tudo”, o foco se centre apenas no “controlo da avaliação”.

Da plateia vieram mais perguntas e algumas perplexidades.

“O nosso tempo é um tempo de uma universidade que para sobreviver tem de ir atrás das empresas que inovam”

Carlos Fortuna, docente da FEUC, afirmou que “há decisões a tomar sobre a formação pedagógica” dos professores universitários, uma vez que se depreende estarmos a “chegar a um ponto em que o exterior está à frente da Universidade”.  “O nosso tempo é um tempo de uma universidade que para sobreviver tem de ir atrás das empresas que inovam”, disse, em tom de afirmação mas também de questionamento.

Álvaro Garrido, diretor da FEUC, comprometeu-se a criar condições para que sejam encontrados caminhos para construir na FEUC comunidades de práticas que deem impulso às novas tecnologias.

No final da sessão, António Dias de Figueiredo falou com a RUC. Abordou a questão da avaliação e também o receio que o mundo do trabalho tem em relação à IA poder acabar com profissões, algumas delas ligadas à escrita.

Pode ouvir a pequena conversa no ‘podcast’ acima e conhecer todo o programa de abertura do ano letivo da FEUC aqui.

Fotografias: FEUC

 

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