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José Manuel Mendes: “Estamos transformados em objetos de política, objetos de ciência”

O Observatório de 31 de Dezembro fez uma passagem pelos assuntos do ano 2021 e contou com o comentário do sociólogo e professor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), José Manuel Mendes.

2021 foi integralmente vivido com a pandemia de Covid-19. No próximo mês de Março contaremos já com dois anos de convívio com a realidade das restrições e controlo sanitário. O sociólogo José Manuel Mendes recordou o número de dias vívidos em Estado de Emergência entre 9 de Novembro de 2020 e 30 de Abril de 2021: “173 dias, num estado de direito tem muito que se lhe diga”, afirmou.

O sociólogo defende que já se podem identificar algumas consequências da vida em pandemia. Houve um teste de cidadania e “as pessoas aprenderam a viver na pandemia”, com as regras impostas em “lógica topdown“, e isso demonstrou níveis altos de disponibilidade para a “aceitação de medidas que vão muito além do que seria razoável”. Acrescentou que com o conhecimento acumulado relativamente às soluções encontradas para conviver com a pandemia, não seria de esperar que, a esta altura, estivéssemos novamente a navegar um momento de incerteza com as entidades oficiais a não se mostrarem capazes da mesma capacidade de adaptação. Não há, referiu José Manuel Mendes como exemplo, uma política de saúde europeia comum que consiga normalizar as regras e os procedimentos a adotar perante determinados cenários e as consequências para as relações sociais são graves com o cimentar da desconfiança entre as gerações e uma constante tensão em que “as pessoas nunca relaxam”. Concluiu que “estamos transformados em objetos de política, em objetos de ciência”.

“Foi exemplar a forma como os docentes estudantes e funcionários se adaptaram.”

À situação das atividades letivas na Universidade de Coimbra esteve presente como espetador, admitiu, devido ao ano sabático que agora cumpre. Reconheceu que foi critico dos sistemas mistos no início mas que a UC e a sua comunidade se adaptaram e promoveram um primeiro semestre “exemplar” no regresso às atividades presenciais. O travão na época de avaliações do primeiro semestre, como tentativa de manter a atividade presencial, foi “interessante” na opinião do docente da FEUC. Sem esquecer a matriz presencial da Universidade mas considerando “otimista passar tudo para 9 de janeiro”, defendeu que já devia estar definido o que acontecerá se não se conseguir passar às avaliações presenciais na data prevista porque “já experimentamos os modelos todos” e “temos de ser claros e objetivos” perante as situações. Criticou a falta de concertação entre a tutela, as reitorias e as faculdades. No Ensino Superior de uma forma geral, e na Universidade de Coimbra em concreto, o docente acredita que também se sentiu a falta de rapidez e clareza da orientação política, que prejudica as pessoas e os estudantes.

O número de bolsas atribuídas aumentou consideravelmente e o docente afirma ter havido vontade política em reforçar o apoio à frequência do Ensino Superior. Embora acredite no limite dos recursos existentes, José Manuel Mendes defende soluções maximalistas que apoiem o maior numero possível de casos e façam, a posteriori, a correção aos abusos.

Os dados demonstram que as pessoas valorizaram a qualificação superior como fator de proteção contra o desemprego e que essa realidade, traduzida na revisão em baixa dos números do abandono, tem de ver a continuidade dos apoios além de 2022/2023.

“Havia uma sensação de cansaço” com o município.

Na política local o ano foi marcado pelas eleições autárquicas e pela alteração de maiorias políticas em alguns pontos do país. No caso da Câmara Municipal de Coimbra (CMC) e apesar de as sondagens não terem sido claras, José Manuel Mendes acredita que “havia uma sensação de cansaço não só do executivo” com o anterior presidente Manuel Machado, “mas também das políticas e, sobretudo, da forma de relacionamento com os munícipes” e com a estratégia para as diferentes dimensões da vida em Coimbra. A alteração de poder em “trouxe uma certa expectativa sobre a forma como se faz política e no relacionamento com a cidade” mas uma avaliação concreta só pode ser feita no futuro.

A Candidatura de Coimbra a Capital Europeia da Cultura 2027 pode ser um motivo amplificador das relações do concelho com os vizinhos. Admitindo ter visto uma forte candidatura, “sólida e bem estruturada”, esperava que pudesse ter existido uma ligação mais sólida a cidades na sua envolvente.

“O PS é o partido das mil vidas.”

sobre o momento político pré-eleitoral e os motivos que precipitaram o chumbo do Orçamento do Estado 2022 (OE 2022) e a dissolução da Assembleia da República. O comentador acredita que “o Partido Socialista não fez muito para que o OE 2022 não fosse chumbado” e que a campanha eleitoral esteve no núcleo da mensagem de Natal do Primeiro-ministro, António Costa. Nos desafios para esta eleição antecipada de deputados nacionais, o sociólogo aponta o crescimento da extrema-direita, com o partido de André Ventura à cabeça.

Na revista ao ano de 2021, José Manuel Mendes deixou ainda notas sobre a política internacional com a troca de Donald Trump por Joe Biden no cargo de Presidente dos Estados Unidos da América e sobre as dificuldades da distribuição mundial de vacinas que podem vincar mais as desigualdades se não se libertarem as patentes para a produção livre de fármacos eficazes.

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