[object Object]
26.09.2021POR Rui Cruzeiro

10º BB Blues Fest, 25/09: Another Night in Moita

Rick Estrin & The Nightcats e The Black Mamba

Na segunda noite de Blues na Avenida Marginal da Moita, o público chegou com maior antecedência e em maior número. Explicação que se ouvia de várias bocas: os cabeças-de-cartaz tinham ficado para esta noite. Talvez, mas não foi suficiente para me convencer. A noite anterior tinha sido notável e, para quem está a seco de concertos de Blues há que séculos, era de superação difícil. Dois concertos e uma sandes de courato depois, a opinião mudou. Mas vamos começar pelo princípio (antes da sandes).

 

Rick Estrin & The Nightcats: give the drummer some

Vencedores do galardão da Melhor Banda dos Blues Music Awards em 2021, liderados pelo vencedor do título de melhor harmonicista da edição desses prémios do ano passado, Rick Estrin, e acabadinhos de chegar da Suíça, os Nightcats vieram à Moita e trouxeram nas malas um concerto de Blues que ofereceu muito mais do que música.

Rick Estrin levou a harmónica aos beiços muito jovem e saltitou entre São Francisco e Chicago durante a adolescência e a idade adulta, lá pela década de 1960. Conta várias vezes que a sua irmã foi a principal influência no seu gosto musical – tanto pelo álbum que ela lhe ofereceu no 12º aniversário, The Genius Sings the Blues, de Ray Charles, como pelas músicas de Little Richard, Chuck Berry, Fats Domino e Elvis Prelsey que a irmã ouvia nas festas com as amigas, a que Rick, seis anos mais novo e impedido de participar, assistia escondido. Mesmo estando no olho do ciclone da cena hippie, a inclinação musical de Rick não se alterou. Ajudaram, talvez, as suas visitas frequentes a Chicago e a sua proximidade a Rodger Collins, que o acolheu debaixo da asa e lhe deu inúmeros ensinamentos sobre música e o mundo do espetáculo.

Descreve-se perdido nos primeiros anos da sua carreira e conta várias vezes que atravessou fases problemáticas. Ao contrário de muitos bluesmen, que vão buscar inspiração ao infortúnio (como Tail Dragger admitiu na noite passada), Rick admite que só depois de endireitar a vida é que conseguiu começar a compor e manter trabalho estável. Nessa altura, integrou de forma permanente a banda de Charlie Baty, Little Charlie & The Nightcats, e, quando Charlie decidiu aposentar-se em 2008, Rick assumiu a liderança. Anos depois, aterraria em Lisboa e subiria ao palco do BB Blues Fest.

Ao pegar no microfone, fez contas de cabeça. Terá passado por 32 países e só agora conseguiu vir a Portugal com os seus Nightcats: Lorenzo Farrell no baixo e no teclado, Kid Andersen na guitarra e Derrick “D’Mar” Martin na bateria. Ao longo de todo o concerto, Rick Estrin & The Nightcats pegaram nos seus temas e expandiram-nos, coloriram-nos, filigranaram-nos: o humor, os passos de dança, a exibição das habilidades de cada um e os temas perfeitamente entrelaçados em solos de todos os instrumentos – e, lá pelo meio, em notas de We Are the Champions e Thunderstruck – transformaram todo o concerto em algo maior do que a soma das músicas, numa tapeçaria completa.

As músicas iam sendo ornamentadas com as habilidades de Kid Andersen na sua Gibson ES-355 e o carisma energético de D’Mar. Rick pode dar o nome à banda, mas Andersen e D’Mar têm tanto protagonismo como ele. Dá ideia que Rick se diverte com aqueles dois tanto como nós: mais ou menos a meio, desaparece no fundo escuro do palco e deixa a luz só para a banda. D’Mar ordena palmas do público com um “Give the drummer some!”, salta sobre a bateria e começa a tocar com as baquetas em tudo o que encontra: microfones, a estrutura do palco, a guitarra de Andersen, a sua própria bochecha e o equipamento dos Black Mamba, que tocariam a seguir. E, um pouco mais tarde, deixa Andersen exibir-se à vontade, solando com a guitarra atrás da cabeça e com a boca. Fácil de perceber porque é esta a melhor banda de Blues deste ano. E também porque Richard Ray Farrell e os seus Leisureman, que estiveram naquele palco na véspera, estavam agora ao meu lado no público, de regresso a Espanha adiado.

Estava explicada a maior afluência de público desta noite. Satisfeito, fui comer o tal courato.

 

The Black Mamba: sai Gibson, entra Fender

Depois de Rick Estrin descer do palco para apanhar um avião de volta aos EUA dali a poucas horas, os vencedores deste ano do Festival da Canção e finalistas do Festival Eurovisão da Canção, sobejamente conhecidos do público, regressaram ao BB Blues Fest quatro anos depois. Na 6ª edição do festival, em 2017, partilharam o palco com Zac Harmon e a sua banda, também norte-americanos. Desconheço a reação de Zac na altura, mas a de Rick Estrin pude ver: ao caminhar à frente do público em direção à saída, deteve-se um momento a ouvir e mostrou o polegar ao Tatanka.

Saindo do Blues raiz, mas sem deixar que se perca o rasto à sua influência, a banda de Lisboa trouxe temas como Believe, Love Is On My Side, que lhes deu a vitória no Festival da Canção (tema com que fecharam), e lá no meio Crazy Nando, o seu single mais recente, que irá fazer parte do próximo álbum, Another Night in Amsterdam, de lançamento para breve. Para o fundo do palco, a banda trouxe alguns dos seus vídeos, incluindo o de Crazy Nando, gravado num hotel em Roterdão apenas com a ajuda de câmaras, confinamento obrigatório e algumas perucas louras.

Houve alinhamento, também, de aniversários. No 10º aniversário do BB Blues Fest, dois membros dos Black Mamba sopraram as velas. Rui Pedro Pity, baixista, fez 35 anos antes da meia noite e Marco Pombinho fez 45 depois das doze badaladas. “45 batatas, o George Clooney dos keyboards”, comemorou Tatanka.

A terminar, em paz com o sabor agridoce do título de finalista do Festival Eurovisão da Canção, Tatanka redimiu o seu orgulho de guitarrista. “Ao menos fomos os únicos gajos que fizeram um solo de guitarra na Eurovisão”, brincou. Estou contigo, Pedro: aqui entre nós, que ninguém nos lê, antes ser embaixador da Fender em Portugal.

 

Wrap-up

A RUC desligou os gravadores, fez as malas e voltou para Coimbra, mas o BB Blues Fest continua. Há Blues Picnic no dia 3 de outubro no Parque José Afonso, na Baixa da Banheira. Entretanto, amanhã, 27 de setembro de 2021, o Every Monday I Have the Blues vai ser um especial dedicado ao BB Blues Fest e é proibido perder.

 

Créditos das fotografias: António Calado – BBClic – Junta de Freguesia da Baixa da Banheira

Agradecimentos: Associação BB Blues Portugal e Câmara Municipal da Moita

PARTILHAR: